No solo que a coreógrafa Vera Mantero apresenta nesta 24ª edição do Festival Panorama ouvimos o filósofo Gilles Deleuze dizer que um corpo deve ser definido pelo seu poder de afetar e ser afetado. A programação deste ano toma a liberdade de expandir a ideia para o corpo que sente o outro, a passagem do tempo, a escuta dos discursos mais escondidos na vida e na cidade.

 

Neste ano difícil para o Brasil e para o mundo, onde o confronto de ideias está tão polarizado, o Panorama reforça seu papel articulador de geografias, visões artísticas e utopias. No palco, no jardim, na rua, na sala de aula, na praia. O corpo é uma arena de movimento e palavra, um embate de linguagens em que nem sempre o mais forte vence e em que, no que depender do festival, todo mundo pode ter voz.

 

Uma programação espalhada por todas as regiões do Rio, este cartão-postal em transformação que é a casa, a inspiração e o desafio do nosso festival. A ocupação nas ruas e praças cresceu, ganhou o nome de Panorama na Paisagem Carioca e abre mais janelas para os moradores que passam e constroem este corpo que é, no fundo, um corpo geografia da cidade. Chegamos pela primeira vez ao Parque de Madureira, voltamos à Cinelândia e ao Campo de Santana.

 

As relações entre movimento, palavra e discurso são evidentes em vários trabalhos desta edição, em formatos variados. Outra teia de relações entre linguagens ganha um programa especial na nossa primeira ocupação da Sala Cecília Meireles: dança e música como processos de composição.

 

Cantoras de cabaré marroquinas, internas do sistema prisional brasileiro, artistas de vários matizes. Vozes de mulheres que não escolhem entre dançar e falar. Imaginar o outro, imaginar o mundo pelo olhar do outro. Seja no Centro de Artes da Maré, no Centro Cultural Banco do Brasil, na Praia de Ipanema. Bebês, senhoras, jovens e adultos são convidados a parar por algum tempo e estar juntos. Experimentar ser afetado.

 

Este Festival Panorama, o 24º ininterrupto, acontece pela resistência de um grupo imenso de pessoas, artistas, patrocinadores e gestores públicos que rejeitam o discurso predominante da crise e seguem investindo na arte e na cultura do Rio de Janeiro.

 

Abrimos o festival no Parque Lage, nosso parceiro de aventuras há cinco anos. Comemoramos juntos o aniversário do Oi Futuro, esse projeto visionário que completa 10 anos de vida e de parceria. Outra parceira de muitos anos segue conosco em 2015: a Contax. Estamos outra vez com a Prefeitura do Rio, a Secretaria de Cultura e seus espaços culturais e este ano comemorando juntos os 450 anos da cidade com estreias cariocas e uma discussão sobre a história da dança. Outra empresa que completa 10 anos de Panorama é a Petrobras.

 

Fechamos a programação na Cidade das Artes, um centro cultural que soube transbordar a monumentalidade de sua arquitetura para sua programação ousada, aberta e que, como seu prédio, redesenhou a paisagem cultural do Rio. Com eles fazemos o terceiro ano do Panorama Carioca na Cidade das Artes, que convidou mais dois artistas locais a criar especialmente para o espaço.

 

Toda essa rede de afetos e efeitos aposta no inesperado, no que não se encaixa, no que faz o público pensar diferente sobre coisas diferentes. Aposta, sobretudo, na frase da escritora e ativista americana Alice Walker: tempos difíceis exigem dançar furiosamente.

 

Nayse López, Renata Pimenta, Renato Saraiva e Santi Elias

Diretores